segunda-feira, 30 de março de 2009

Uma nova estirpe


Aparentemente são seres humanos normais, vestem como tal, são bípedes, falam, opinam, postulam regras e máximas, cheios de si e de razões, vazios de princípios, de ética e de cultura. Herdeiros órfãos falidos do império referem-se à província, onde têm quase sempre origem, como se se tratasse duma colónia, algo bizarra, a que um dia deviam prestar atenção, um filão que um dia poderá dar dinheiro se… Nunca pescaram, nunca foram à caça, não sabem o que é ir aos ninhos,incapazes duma cortesia não sabem o significado de palavras como camaradagem ou solidariedade. O outro é um cliente na melhor das hipóteses, habitualmente uma vítima.
Há que saber que pensam com a carteira muito, julgam e opinam com o estômago bastante e sentem com os tomates pouco. Seres desprezíveis sem urbanidade, cortesia ou gentileza. Falam do que não sabem e calam o que sabem, as suas misérias e desgraças. Eis os urbanóides cujos figadais inimigos são em abstracto a verdade, a polidez e a delicadeza e em concreto os urbanos a quem chamam depreciativamente educadinhos idealistas e os rurais a quem apelidam de pacóvios coitados.
Podemos vê-los como políticos de segunda linha, comentadores a soldo, jornalistas de tablóides, actores de aviário, estes os mediáticos os outros escondem-se atrás do volante dum táxi, dum balcão dum banco, dum blog sem nome nem cara, aparecendo pontualmente como testas de ferro em esquemas de duvidosa legalidade.
Cuidado, estas criaturas reproduzem-se.

terça-feira, 24 de março de 2009

Aviso à Navegação



A vida às vezes parece ser um jogo de espelhos.
Se um falido é pessoa que faliu ou ameaça abrir falência quer dizer que é uma criatura que falta ou faltou aos compromissos, que suspendeu os pagamentos, que falhou, que faltou à palavra, que foi desleal, que enganou ou pretendeu enganar; se chulo quer dizer que é lascivo, ordinário e vive à custa de mulheres enganando-as; questiona-se se é legal alguém com um perfil assim desenhado, embora no gozo de todos os direitos cívicos, poder ou não candidatar-se a um lugar da administração pública, onde vai gerir aquilo que é de todos nós. Claro que pode, a lei permite-o. E até pode ser eleito. Mas não quero falar de alguém a quem a vida pode ter sido madrasta e teve que se valer dos mais vis expedientes. Quero exarar aqui o meu protesto contra quem o empurra e lhe serve de esteio, pois demonstra de imediato não ter princípios, não ter moral e possuir apenas um apetite voraz pelo poder. A política tem que ser a mais nobre actividade das actividades humanas, à qual só se devem dedicar pessoas impolutas, de passado imaculado, porque como diziam os latinos à mulher de César não lhe basta ser séria tem que o parecer.

sábado, 21 de março de 2009

É Assim


Agora que começa a Primavera, período em que todos os corações se agitam num sentimento de rejuvenescimento, apetece-me contar uma história pouco primaveril, mas que envolve mudança e séria. Não é um conto, trata-se do relato de algo que aconteceu. É a narrativa dum facto, onde são ocultadas datas e nomes. Tudo o resto é verdadeiro e encontra-se publicado parcial ou integralmente em diversos livros.
Tudo o que omito é para bem de todos os que me rodeiam, pois convém manter afastados os holofotes do Vaticano, da CIA, da Mossad, do Islão e até mesmo do Diabo em pessoa.
Até parece que sou um iniciado...Ah, Ah, Ah!!!
A coisa conta-se em poucas palavras. Um padre jesuíta licenciado em Física pediu para se doutorar e foi autorizado. Qualquer coisa parecida a conceder liberdade total e licença a um cérebro dedicado à especulação físico-matemática pura. O bom pastor esqueceu o humano rebanho e preocupou-se com um assunto mal explicado: as radiações fósseis. Começou por estudar os apontamentos do engenheiro americano que ficou com a tablete de chocolate derretida no bolso e que tinha descoberto que a origem da coisa tinha sido a radiação duma antena das várias de multifrequência nas quais trabalhava. A responsável era uma que emitia em ondas muito curtas. Todos temos em casa os microondas que se baseiam nessa descoberta. Mas havia mais. Para onde quer que se orientassem antenas de determinado comprimento detectava-se uma radiação de frequência permanente e que parecia ter origem em todos os sítios e em todas as coisas. Posteriormente demonstrou-se que estava presente na Lua, a tal radiação fóssil cuja origem estará no Big Bang.
O padre/físico começou a fazer as suas contas e as suas medições, porque a Física só mede nada mais, e descobriu que todos nós, pessoas e animais modelávamos aquela radiação. A partir dum detector que a desmodelasse tudo era possível, desde gravar o Sermão da Montanha a filmar a Paixão de Cristo, desde um banho de Cleópatra à chegada de Vasco da Gama a Calecut., qualquer coisa que tenha realmente acontecido e que se quisesse confirmar. Antes de ser posto a bom recato e antes de qualquer experiência mais dolorosa, foi dizendo que amanhã não era a véspera do dia em que divulgaria a técnica, pois o saber teórico era de muitos conhecido.
O Homem soube sempre ultrapassar todas as dificuldades que lhe foram propostas, mas a Verdade será mais forte e destruidora que as mentiras piedosas e medíocres que cimentaram séculos de civilização?

quarta-feira, 18 de março de 2009

Cântico Branco



Levantei-me com a boca a saber a sangue, e senti-me triste, pois não havia cânticos nem sorriso nos meus lábios. O dia foi-se fazendo azedo à medida que as horas passavam e as soluções dos problemas que me são colocados se aproximavam do zero, numa espécie de cologaritmo da concentração ou da ausência de disponíveis com sentimentos elevados. Por outro lado, por mais exercícios que faça, dos gémeos aos cruzados, há sempre um músculo que me apresenta a conta, ou melhor, me manda consultar o Bilhete de Identidade.
A isto chama-se envelhecer.
Projectei envelhecer serenamente, pensando, lendo e escrevendo uma ou outra linha sem encomenda e só por gosto. Tenho o secreto desejo que me façam avô e me deixem deseducar criancinhas, satisfazendo-lhes todas as vontades e caprichos, deixando-as derrubar livros e bibelots.
Garantem-me que é melhor assim, ter o tempo todo ocupado, ser intermitentemente house kipper e manter o outro, o homem/mulher esse ignoto ser, como razão de existência.
Apre, isto é a mesma coisa que ter trabalho certo, objectivos a cumprir e toda a panóplia de deveres sem poder reivindicar aumento de vencimento, melhor horário, por em causa a competência do chefe, fazer uma greve…
Trabalho voluntário só para gente de carne e osso com espírito de santo.
De carne muita e osso sou, santo não, nem parecido sou…

sábado, 14 de março de 2009

8 de Março

A Mãe natureza fê-la mãe. A pele ia do toque de seda ao de veludo. Não era uma Barbie, era garantido enfarte dum banqueiro. Tinha tudo o que os homens gostam, desde a beleza e equilíbrio natural à vertigem do abissus abissum. Interiormente, muito raramente se entregava ao tirano e quando o fazia era porque o corpo lhe ostentava o vencimento da biológica letra, em raros momentos mágicos que produzia aquele encantamento de responder sim, sem o dizer, a uma pergunta que não se fez. A maioria das vezes freira de clausura numa perpétua quaresma não pretendida. Farta do quotidiano abominava as surpresas pois só traziam mais contratempos que prazeres.
Óbvio que as palavras que escrevi se aplicam a um sem número de pessoas, com as devidas adaptações, a quem tiro o chapéu, hoje e sempre.
Recuso-me a celebrar mais um dia de actividade acrescida para o comércio, por mal que este esteja. Da meiga galega à dona de casa independente todos os dias são delas, pois garantidamente trabalham duas vezes o dia dum homem.
Aqui fica o meu preito e homenagem: à minha mãe, à minha mulher, à minha filha e a todas as mulheres que estiveram sempre tão presentes na minha vida, as minhas tias, as minhas irmãs e as minhas amigas de agora e de outrora.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Velhas ao Soalheiro


Nas aldeias da serra é costume ver as velhas à porta das casas, apanhando os raios de sol em amena cavaqueira, forma de dizer no corte ou na má língua, exclusivo desporto mental, e a cometerem o único pecado que lhes resta, murmurar do próximo, neste caso afastado.
A minha terra é uma cidade fria, muito fria. Foi aqui recentemente inaugurado um Centro Comercial idêntico a todos os outros que por esse mundo existem. Vários pisos, muitas lojas, restaurantes, várias salas de cinema, um espaço apreciavelmente grande e agradável. Bem decorado, talvez bonito mesmo e mais importante que tudo isso, equipado com ar condicionado logo aquecido. Pergunta-se a quem lê estas linhas, como será designado este espaço na gíria da população mais velha da cidade? Os reformados e outros desocupados enchem aquela “Praça de Comércio” devidamente amornada, e aí se sentem acalentados e seguros. Então, para meu riso, ouvi um recém reformado ser convidado por outro a aparecer no Centro de Dia.
A minha terra é mesmo sui generis, porque não há paridade mais dissemelhante que estes dois conceitos, Centro Comercial e Centro de Dia. Este poder de apropriação mostra pelo menos que a minha terra está viva, ainda não morreu.

terça-feira, 10 de março de 2009

Melhoras


Constipado, sem sabor nem cheiro, espirrando e com um trombil digno dum elefante, lá vamos atravessando este Março que por agora se mostra sorridente e luminoso. Começam a ouvir-se ecos menos fúnebres sobre a Crise. O Bezerro começa a dar sinais de melhoras. O grande veterinário não me parece ter sido o messias Obama mas um europeu e pouco dado às coisas esotéricas, chama-se Jean Paul Trichet e é presidente do Banco Central Europeu. O homem apenas disse que se os bancos não emprestassem dinheiro o BCE fá-lo-ia directamente e sem intermediários. O Bezerro, ou se quisermos, o mercado, cujo comportamento nunca é lá muito racional, entendeu a mensagem e mexeu-se. O hálito era menos nauseabundo e os grandes sacerdotes começam a falar, ainda que baixinho, de melhoras. O Citigroup já tem lucros este trimestre e as bolsas já subiram hoje 4 e 5 por cento, quer do lado de lá, quer do lado de cá do Atlântico.
Eu é que não melhoro. Devo começar a ficar alérgico à beleza e ao bom tempo. Céu azul e sol doirado tornam-me num musaranho inclassificável. Uma rede separa-me dos prazeres da vida.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Março


Mês cujo nome é homenagem ao deus guerreiro. O planeta tem duas luas Fobos e Deimos, o medo e o pânico, filhos de Ares e Afrodite, (Marte e Vénus).
Não sou dado à Astrologia, mas convenhamos que mês com semelhante patrono e em tão boa companhia, teria que ter um magnífico efeito na minha disposição, pelo menos por sugestão. Há alturas que brilhando vermelho no horizonte cintila e fascina. Em algumas culturas orientais é a Estrela de Fogo. É a cor avermelhada que lhe dá todos os bons atributos. É a proveniência, pouco imaginativa, dos Ovnis…
Houve um tempo em que Março para os romanos era o primeiro mês do ano, começo dum novo ciclo. Percebe-se, pois é a época do equinócio da Primavera, e isto tem os seus efeitos. Até ao fim do sec XV na Rússia o ano começava no primeiro de Março e no Reino Unido e colónias o ano começava a 25 de Março, isto até 1752. A 21 de Março tem inicio o Ano Novo de 19 meses da religião Baha'i
Mês em que tenho tido diversos penalties, incluindo o da minha estreia profissional.
Mas mais que tudo, o mais importante é ser o mês de regresso das andorinhas, é o mês que a natureza emita as aguarelas dia sim, dia sim. Digno de todos os humores e de todas as estações: Março marçagão de manhã inverno, à tarde verão e à noite focinho de cão. Por muito mal que queira dizer não posso negar em sinopse assertiva o aumento de temperatura, a beleza renascida, o sorriso reencontrado, desejo de vidas novas, o descasque do belo sexo.
Viver é um processo permanente de adaptação e tristezas não pagam dívidas. Sou sensível ao inconstante e volúvel mês de Março, uma escada pouco limpa que não sobe nem desce, a ponte que não atravessa, estacado movimento, mas real metamorfose interna e manifesta.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Primavera


Não sei se existo, se resisto.
Se persisto só porque insisto.
Ou só existo pois à dor resisto.
Sinto muito, pois sinto-vos
Nisto.
Apalpo-me e sinto-me
A viver julgo-me
Mas sei-me semimorto.
Anúncios de Primavera, uma treta.
A Primavera ata-me
Março maça-me, Março mata-me
Sem doçura
Fosse a estocada rápida sem brandura.

terça-feira, 3 de março de 2009

Escadas, do entendimento?



Escadas sobem-se e descem-se, por vezes depressa demais e com prejuízo. Subimo-las a correr e cansamo-nos, ou galgamo-las abaixo e depressa começamos a contá-las pelos ossos partidos.
Somos pelo ecumenismo. E devemos convir que isso sim, é subir escadas íngremes e sem esteio. Tem de ser devagar, muito devagar, sobretudo quando parece que o próximo passo é simples e evidente.
Isto vem a propósito de não conseguir classificar o meu país como mono cultural ou multicultural. Ambos os qualificativos estão errados. Se fôssemos uma sociedade como a francesa, em cujos princípios a grande maioria se revê, seria mais fácil discorrer sobre o tema. Se fôssemos como nas ilhas britânicas onde parece todos poderem viver, vestir, ou comer à sua maneira, também a coisa era simples. Mas entre nós nada é assim.
Dizemos ser condescendentes, e não racistas, mas se um indiano se cruza connosco exibindo o seu turbante ouve-se por perto uma voz: aos cabeças atadas era fazer de cada um dois; se um inglês, very british, educadamente pergunta seja o que for, escutamos a expressão:- esse inglês do carais o o que é que quer, que aprenda a falar como nós que também aprendemos inglês, patati, patata.

E se contratar uma árabe para trabalhar em casa? Não ponho a hipótese de se ser talhante, contrato-a para trabalho doméstico e isso obriga-a a cozinhar. De certeza que nem a senhora me cozinha a morcela ou a chouriça nem prova o vinho. Se a ponho na rua sou racista se fico com ela sou burro.
Dir-se-á que isto só pode ser dirimido pela lei. Se numa sociedade dita católica como a nossa, um praticante desta fé diz ao chefe: -"tenho aqui ao telefone o senhor fulano de tal", e lhe responderem, "diz-lhe que não estou". Então o bom do cristão, que não pode mentir, fica num dilema pois se o fizer vai para o inferno se não o fizer vai para a rua. Obviamente que isto é o limite. Mas o bom senso por onde anda? Não andará por aí alguém a acelerar de mais? A moral deste país não é a lei. Não o é porque o povo não se reconhece nela, essa é a verdade dolorosa. Fazem-se leis não nas costas do povo, fazem-se leis que o povo estranha, lhes parecem absurdas e depois não lhes liga. As leis começam a ser uma bizarrice do poder, nada de sério. Dar trabalho às ASAEs. Porque quando é a sério, vai-se de enxada ou de escopeta. Ao legislador eu diria slow down.
Assim somos…

segunda-feira, 2 de março de 2009

Contracanto















Vem de verde
E de muitos matizes
Se renova.


Anualmente, por enquanto,
E por quanto tempo mais?
Na Primavera débil
Um pensamento, um desejo
O renascimento
Clássico e silvestre.

Trovoadas, inicio de gritarias,
Pigmentações suspeitas,
Íntimas e manifestas.
Procedências
Concepções e nascimentos
Suicídios.

Estremece-se o cão,
Porque me assustas tanto
Março marçagão?