quarta-feira, 30 de junho de 2010

PSI20 Portuguese Stock Index


Todas as doutrinas e práticas político-sociais pretendem evoluir no sentido de satisfazer as necessidades de todos e de cada um de nós. Isto não é linear nem simples. Há sempre um jogo/combate entre quem detém o poder ou melhor, quem possui a riqueza e a pode distribuir (poucos) e os que dela precisam (muitos).
Não pretendo escrever sobre pirâmides de necessidades nem sobre redistribuição de riqueza, quero apenas fazer eco, - isto sim é presunção -, do que ouvi ontem no canal “Q” do MEO (posição15). Alguém afirmava, com a autoridade de quem conhece os números: os gestores das empresas que constituem o PSI20 ganham tanto quanto 1/3 das pessoas que recebem o Rendimento Social de Inserção, as que não têm qualquer outra hipótese de auferirem outro ganho. Alguma coisa como o número de pessoas que cabem em dois autocarros (150), auferirem tanto como quem esgota 4 campos de futebol (380.000/3).
A verdade sem a cobertura do manto diáfano da fantasia é lixada e tira credibilidade aos habitués das feiras e aos falcões que se preparam para tomar conta do galinheiro, por bem construídas e melhores que sejam as bocas perdão, sound bites que emitam.

domingo, 27 de junho de 2010

Lembrando


A actividade bancária tem por objectivo comprar dinheiro a preço baixo e vendê-lo mais alto, gerando finanças que suportem os grandes projectos, a compra de casa e o crédito pessoal, sem spreads, palavrão inglês que esconde a usura, crime punido por lei.
A banca portuguesa foi sempre avant garde, e os seus departamentos de estudos, de informática, de organização e métodos foram pioneiros universais. Desde a cor do papel, formato, ao circuito, tudo foi medido ao cagagésimo.
Sobrevivente sou, actor e vítima fui.
Em tempos de crise as margens de comércio bancário foram grandes. Chegou-se a ter os depósitos a 30% e o papel comercial com alcavalas à cabeça acima dos 50%.O Fundo de Garantia era de 12%. Apenas uma percentagem dos depósitos podia ser emprestada. O turismo, as acanhadas exportações e as remessas dos emigrantes repito, as remessas dos emigrantes pagavam tudo ou quase tudo. Quem determinava a velocidade da rotação de capital sabia quem pagava o petróleo, as obras, os electrodomésticos e até o ensino. A integração na comunidade europeia aconteceu e a intermediação bancária esmagou-se, a poupança não chegava e o capital, que não tem pátria, castigou mais, tornando mais brando o esforço de cada coisa, desde que fossem mais coisas, muitas mais. Impôs-se o cross-seling. Quem precisasse dum plasma levava (leva) um seguro e um cartão de crédito. Venda cruzada de produtos, baixa-se meio ponto na taxa deste e entrega-se como por encanto, e sem ninguém pedir, um pacote completo.
A pergunta pode não ser pertinente, mas onde andará o dinheiro de que fui o fiel recebedor? Onde andarão os aforradores dos pequenos valores de quem ouvi a sonsice dos que querem ser eternos: é para a mortalha, para o funeral, porque não quero deixar cá questões. Pequenos valores, documento por documento, dos quais tinha que calcular juros até ao fim do ano. Posição e controlo de capital e juros. Apanhamentos por livros, acerto dos mínimos.
Nem a massa nem as palavras se importavam.
O negócio era o juro, as reservas reais e o algoritmo matemático.
Era sério, leal e honesto.
Mas, naquele tempo, o bom, o melhor mesmo era eu ser mais novo.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

O Capitão Galáctico


Conheci o Capitão Galáctico.

Lúcido, excessivo, budista, católico, judeu, nacional-socialista, cheio de dinheiro e com um nauseabundo cheiro a loucura, miséria e morte. Desprezava como eu a falta de luz própria. O Capitão Galáctico tinha a sua loucura mas sempre encontrei nexo no que dizia.

Envelheceu prematuramente, ou talvez não. Depois de inabilitado a linguagem eram farrapos de frases.

O unicórnio procurava a espada...

Foi na estação que o vi pela última vez dum lado da rua como alguém que há muito tempo se despediu deste mundo, porque fujo dos que estão marcados pela morte. Não o cumprimentei, pior, fiz que não o vi. Não precisava de lhe dizer nada, porque quem parte é que se despede, desculpa estapafúrdia

Isto fixou-se na minha cabeça como uma triste e repugnante perversidade da minha vida. Foi abjecta. Ele num estado deplorável e eu com medo de o cumprimentar. Isto é tão execrável que já tinha esquecido. Hoje passei à sua porta. Passei, olhei, escutei o rádio do carro, mas não tive ocasião de fugir à recordação.

Somos assim mesmo.

À mercê do medo social e da mesquinhez.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Homem Aranha e calibre 12


O Vice-Rei do Norte, com nome de figura de banda desenhada, pretende, com a sua proverbial cultura, duma penada desfazer todo o esforço de paz social. Puxa pelos galões, ganhos na tarimba político-partidária, para dar cobertura não a uma democrática desobediência civil, mas à revolta. Carais perdão, carago, esqueceu-se de ameaçar com o calibre 12. O pretexto é o chip nas matrículas que ofendem a privacidade de movimentos e servirá para pagamento nas scuts da área da Junta Metropolitana do Porto. Pagar ninguém quer, mas iria jurar que o mesmíssimo senhor, em comentário publico, há uns tempos aquando do nine/eleven, defendeu a utilização do chip de identificação para humanos, colocado debaixo da pele de qualquer indivíduo. Garantia que este sistema permitiria um grau de certeza quase total na identificação de pessoas em instalações como aeroportos, sem considerar a flagrante violação das liberdades individuais.
Há os que publicam o cérebro e os que o praticam… A memória é um função estranha e a coerência uma chatice.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Quinto Império


Quem leu a Jangada de Pedra entende que hoje faleceu um dos profetas do Quinto Império. Ancorar a Península Ibérica algures no meio do Atlântico entre a América Latina e a África, foi a imagem que faltou a Vieira e de que Pessoa só viu parte. Goste-se ou não do autor é evidente que fica na História do país e da língua em que se expressam duzentos milhões de pessoas. Parece-me razão suficiente para esquecer o mau feitio e as opções que tomou enquanto ser vivente e importarmo-nos com o essencial, a sua obra. Sei que detestaria que lhe chamasse semelhante coisa, profeta. Tomo essa responsabilidade e sei que não é nenhuma blasfémia, e no dia da sua morte digo glória a Saramago, pois os profetas, as palavras e as figuras que criam do nada são eternas.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Machadada ou eutanásia.


Passámos demasiado tempo sentados à espera do nosso tempo. Está visto que temos de tomar este tempo como sendo o nosso.
Quando ouço falar do encerramento de escolas com menos de 20 alunos ocorrem-me várias coisas, e entre elas, a famigerada regionalização contra a qual votei e votarei. Contudo, reconheço que se ela existisse essa medida nunca seria exequível, porque se as Regiões existissem não se poderia fazer a eutanásia, (eufemismo piedoso), dos já moribundos concelhos e freguesias do interior. Há escolhas a fazer e o critério tem que ser rigoroso. Já aqui falei do risco de se constituir um interland entre um Portugal, que só existe numa faixa até 100 Kms da costa, e a fronteira de Espanha. Levantemos a nossa voz e declaremos bem alto que o combate à desertificação deverá ser feito não fechando, mas instalando no interior serviços prestados pelo estado. Deslocalizar o possível do litoral para o interior, unidades militares, escolas de policia, laboratórios e institutos vários, que teriam a mais-valia de trazer cérebros e gente capaz de criar clusters, empregos, população e com ela massa critica. Quem tem coragem para fechar uma grande percentagem de escolas do interior (provavelmente uma medida com critérios justos embora eu não os conheça) também deverá tê-la para evitar a morte anunciada de parte do seu território. Os senhores que se seguem, já se perfilam no horizonte e os media já nos garantiram quem são, agradecem tudo o que for fechar e privatizar serviços/criar negócios, e com esses não contemos, porque para eles apenas somos números, e números pequenos, já se vê. Se tiver que ser, fechem-se escolas, mas garantam-se contrapartidas. Temos pouco tempo, façamos o impossível: fujamos à força concentracionária de Lisboa.

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Haja decência


Do defunto papão comunista que comia criancinhas (que Deus me perdoe pelo que acabei de pensar), ao imperialismo americano, agora mais ocupado com os seus assuntos internos do que na construção da American Pax, passando pelo refluxo dos movimentos árabes mais radicais, e com a oposição sem a coragem de tomar o poder, resta-nos o governo a servir de bode expiatório. Nem no consulado de Santana vi tanta unanimidade. Recebo emails de todos os sectores de opinião satirizando e socratisando os nossos dias.

Julgo não fugir à verdade dizer que desde Afonso Henriques, com o bem lembrado esquecimento de pagar o que devia, o povo desconfia do poder. Para o Zé-povinho o Estado nunca foi pessoa de bem, salvo com os excepcionais e honrosos momentos como os de D. Pedro I, D. João II, Conde da Ericeira e Marquês de Pombal. De resto a nossa história é igual às dos outros países, escrita pelos poderosos. Foi tirar aos fracos e proteger os fortes. Foi isso o exercício do poder, até ao fim do Ancien Régime ou da Idade Moderna, como aprendi. Depois, nem em toda a Europa a coisa foi igual…

Como com a globalização e a crise, ou o mercado e as finanças em reestruturação, ou o Bezerro a recompor-se, que é a mesma coisa, legitima tudo, atrevo-me a dizer que há condições objectivas para o governo fazer duas coisas: despenalizar-se o corruptor activo e atirar-se como gato a bofes aos trânsfugas aos impostos que nos gozam de fininho, aos que vivem em resorts no Algarve, aos que utilizam carros de alta cilindrada em nome de sociedades sediadas sabe Deus onde, aos que não têm despesas pessoais e titulam contas em offshores mas que a Banca Nacional sabe e pode identificar. Isto porque é Verão e apesar de tudo consegue manter-se a paz social que outros não manterão.

Há dias, um colega ainda no activo, noutro banco que não aquele em que trabalhei, dizia-me que cerca de 60% dos activos do seu banco, titulados por particulares, tinham emigrado para offshores. Senhores do Governo, isto acontece porque deixam ou querem. O nosso melhor capital é o povo, respeitem-no.

O tempo é outro, mas recordo que emiti muita livrança para liquidação antecipada de Depósitos a Prazo.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Polis II


Eu pecador me confesso que pequei por pensamentos malévolos, palavras ácidas, actos de injustiça e a omissão de dizer que não dizia o que dizia não dizer. O espelho de água do polis já brilha em todo o seu esplendor e volta a fazer a terapêutica adequada a quem por ali se passeia. Olhar, ver e apreciar o Belo é o melhor tratamento se não para todas, pelo menos para as dores da alma. Não julgava possível que os serviços responsáveis deitassem tão depressa mãos à obra e resolvessem o problema. Enganei-me, e aqui estou a penitenciar-me do facto. Conseguiram ser mais céleres na solução que no desconcerto, esse sim demorado. Parabéns para quem resolveu o problema, ainda que de maneira provisória, parece.
Exercer a cidadania é também isto, não é morder anonimamente nas canelas de todos e votar de tempos a tempos.
Hoje é dia de Portugal, de Camões e das comunidades. Dia duma raça que ligou o mundo e compôs a primeira globalização, versão 1.0.
Além de se poder vaiar o PM e para lá do futebol, que parece unir muitos, talvez haja o Quinto Império a construir por todos os portugueses como cidadãos livres, fechado que seja o ciclo do desalento.
E se sou cidadão é porque sou livre e assim quero continuar. Não são precisas as luzes da ribalta, nem andar na passerelle dos egos inflados. Basta ser-se livre e eticamente responsável. No que me toca sei o que valho e já não tenho idade para gerir melindres de pessoas emocionalmente instáveis. Não devo nada a ninguém, falo e digo o que preciso e quero, quando e com quem quero. Neste 10 de Junho evoco o 25 de Abril, porque será?

terça-feira, 8 de junho de 2010

Morreu o Zezé Fuzo



Seriam precisos dicionários de palavras por inventar, mas tão reais como a necessidade de respirar, para escrever o que me vai na alma. Como as não tenho, e provavelmente se as tivesse não as mostraria, resta-me ser sério e dizer que morreu um amigo, num ano que me tem sido pródigo… em óbitos. Um amigo, com dedicados amigos, devoto da boa mesa, conhecedor apaixonado e exímio condutor de automóveis, fumador desde muito cedo e até muito tarde, teve vários empregos e nunca o vi de mal com a vida, pelo contrário, desfrutava-a. Sempre com o coração ao largo era de relacionamento afável, urbano, de compleição forte e cara de menino, tinha a esperteza digna dum Malhadinhas e tratava com absoluto desdém os urbanóides, ou os que se portavam como tal, chamando-os de Tétas, Tétas Maleiros, o pior epíteto que atribuía a alguém.

Homem de coragem, de ânimo raro, de vigor invulgar partiu. Partiu, lá para aquele lugar que imagino luminoso e de tons suaves entre o dourado e o azul, aquele espaço sereno onde o equilíbrio reina, lá onde o mal, a imperfeição, as desconsiderações e as injustiças não entram. Partiu para onde só os heróis vão, e o Zézé era um herói. Tinha apenas 19 anos quando pisou e perdeu uma perna numa das malhas que o então império tecia, no lago Niassa em Moçambique. Depois, viveu ou sobreviveu numa epopeia passada em vários hospitais, suportando mais de dezena e meia de operações, até à redentora cidade de Hamburgo.

Foi o Zézé a primeira vítima da guerra colonial com quem convivi. Foi com ele, e ele connosco, que compreendemos de que lado da história nos batíamos.

Calceteiro marítimo não deixava os seus créditos por mãos alheias, e recordo-o, já com a prótese, (que só quem o conhecia sabia que usava), em 1969 distribuir e protagonizar a maior cena de pancadaria que me recordo, quando uns meninos queques de Coimbra vieram à Guarda dar uma lição contra a falsa democracia cripto comunista, expressão que cito de cor dum relatório da PSP que em 74 li na PIDE/DGS. Foi com ele ao volante do seu inesquecível Kadett azul que muitas vezes fui namorar à terra da minha pequena.

Bem Hajas Zé. Bem hajas por teres sido meu amigo.

Os que cá ficámos, ficámos bastante mais pobres. Desculpa não ter sabido aliviar-te as dores e a angústia que ultimamente sentias. Desculpa se não ajudei quando mais precisavas. Desculpa se nenhum de nós foi capaz de te sacar daquela cena.

Tenho a certeza que o bom Deus te recebeu de braços abertos e com todas as honras. É esse o meu conforto.

A toda a família, especialmente à Amélia, Iria e Hugo aqui fica o meu público e fraternal abraço.