terça-feira, 17 de junho de 2025


     NO RESCALDO DAS ELEIÇÕES DE 18 DE MAIO


A história de Portugal demonstra, de forma inequívoca, que o anseio por liberdade, justiça e cidadania não é uma aspiração recente, mas uma constante da construção nacional. A Revolução Liberal de 1820 procurou instaurar uma ordem constitucional baseada na soberania popular e na limitação do poder régio. Já a proclamação da República, em 1910, visava concretizar os ideais de laicidade, educação pública e alargamento da participação política. No entanto, ambos os momentos históricos evidenciaram fragilidades estruturais: a instabilidade governativa, a exclusão social e a incapacidade de consolidar instituições robustas conduziram à revalorização da ordem em detrimento da liberdade e da inclusão. A substituição dos ideais pela imposição da autoridade revelou-se um padrão recorrente na trajectória política nacional, um padrão que explica os seus fracassos e os retrocessos civilizacionais que se lhes seguiram.

O 25 de Abril de 1974 rompeu com esta lógica. Rejeitando a ditadura e o pensamento único, devolveu ao povo português a liberdade e a dignidade de participar activamente na vida pública. O regime democrático consagrado na Constituição de 1976 incorporou - veremos até quando - com inegável densidade, os princípios do Estado de direito, da justiça social e da cidadania participativa. Todavia, os desafios contemporâneos revelam sintomas preocupantes de erosão democrática com a abstenção, o alheamento cívico, a descrença nas instituições, o voto motivado por ressentimento ou impulso, e a ascensão de discursos populistas que instrumentalizam o descontentamento. Estas manifestações apontam para um défice profundo de cultura democrática e para uma crise de cidadania substantiva.

Neste contexto, importa reflectir sobre os desafios contemporâneos à cidadania democrática. O que me preocupa - e que tenho partilhado com os amigos de várias maneiras - é o que julgo ser uma interferência ilegítima e permanente do poder judicial na política, quer por acção, quer por omissão. Esta preocupação revela-se tanto mais pertinente quanto observamos que, hoje, os fascistas não tomam o poder fardados. Tomam-no pelo voto, surgem de fato, sem ideias, de léxico reduzido, cheios de preconceitos, fomentando os sentimentos mais baixos e, garantidamente, nunca deixarão o poder por derrota nas urnas. Haverá circunstâncias imponderáveis que importa identificar. Entre nós, o controlo democrático do Ministério Público é urgente, não pode constituir um Estado dentro do Estado, com calendário próprio e sonhos justicialistas. Culpas há de muitos lados, a começar pela escola. Em todas as latitudes, tomou-se como certo o que não o era. Formou-se toda uma geração com défice de espírito crítico, menos solidária, dispondo de equipamentos e software que não sonhávamos, mas que os mantém permanentemente ligados e facilmente manipulados pelo célebre algoritmo. Não serão, para já, esses jovens a exercer a vigilância democrática. A liberdade conquistada exige cidadania activa, pensamento crítico e resistência às formas subtis - mas não menos perigosas - de autoritarismo.

Importa afirmar de forma clara e inequívoca que o combate à corrupção, por mais necessário que seja, não pode servir de disfarce para projectos autoritários que ambicionam o poder pelo poder, frequentemente sustentados por um discurso moralista e punitivo que esconde uma sede de dominação e de acesso impune aos recursos do Estado. A história ensina que o autoritarismo raramente se apresenta de forma frontal; pelo contrário, reveste-se de promessas redentoras, de apelos à “limpeza” da política e de pretensas soluções simplistas para problemas complexos. Portugal já conheceu essa retórica e pagou por ela um preço elevado.
Ontem, fiquei surpreendido mas não convencido. Vamos combater o ímpeto reacionário saindo da nossa zona de conforto, organizando-nos em grupos de reflexão e acção política. Os nossos princípios superam as nossas divergencias 

 

                                                                                                           

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