segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Crise de alma

O choque petrolífero dos anos 70 e o aumento progressivo do preço da mão-de-obra permitiram investimentos em energias alternativas e parecia constituir-se um novo paradigma. Bastava que estes dois factores se mantivessem. Contudo, nos finais da década de oitenta, e inicio da de noventa, assistiu-se, a nível planetário, ao valor do petróleo a preços da década de sessenta e ao aparecimento da quase gratuitidade da mão-de-obra chinesa. O novo modelo esfumou-se e chegámos onde estamos. Um beco lamacento, velho, cheio de contradições, desumano e habitado por mortos que ainda não sabem que o são. Claro que isto é uma caricatura a traço grosso, porque o traço que vai dar matriz e consistência à actual situação mundial é a expressão de Camões: fraco rei faz fraca a forte gente. Não há no Globo nem líderes, nem profetas, nem soluções. Um pregador não chega, é muito pouco.

Estamos num momento civilizacional em que se promove a não memória, para não dizer o desprezo pelas humanidades. No ensino secundário a Filosofia deixou de ser cadeira obrigatória. em todos os cursos. A História já não era. E um povo que não é ensinado a pensar e não tem memória de si mesmo fica sem referências, não reconhece tradições nem escala de valores e fatalmente gera uma sociedade distorcida e abstrusa.

Tudo isto tem efeitos, e o menor deles não será os juízes dizerem que os políticos se vingam subtraindo-lhes regalias como retaliação às suas, alegadamente, isentas atitudes, nem a importação da ideia de constituição de bandos de jovens delinquentes a vandalizarem tudo e atacarem pacíficos cidadãos nas noites da minha cidade. Gente nova com pais perfeitamente inseridos na sociedade dedica-se à violência gratuita porque isso dá pica. Isto não é nada.,

Quando as manifestações de violência forem inorgânicas e tiverem como força a fome e a desesperança, não começará em cidades do interior, mas nas cinturas das zonas metropolitanas, e então haverá muitas justiças. Encerrado esse período, mais ou menos curto mas violentíssimo, na síntese do confronto também dialéctico, evocar-se-ão então os epígonos da cultura.

Sem comentários: